sábado, 11 de abril de 2015

Gaiatice Cearense - hipótese de como esta prática cultural bem-humorada foi selecionada


É comum ouvirmos dizer que os cearenses são muito brincalhões, divertidos e manjam dos paranauê dos humor. Temos diversos exemplos de humoristas cearenses bem sucedidos, como Chico Anísio, Tiririca e Tom Cavalcante. Então, façamos um exercício filosófico e nos perguntemos: de onde vem o bom-humor cearense?

Bom, podemos iniciar afirmando que se trata da natureza do cearense ser bem humorado. Mas se concordássemos com a afirmativa que o bom humor é da natureza do cearense estaríamos concordando com proposições inatistas e essencialistas a qual os sujeitos não podem fugir a sua natureza, nascerão e morrerão assim. Em análise do comportamentos fugimos a este tipo de explicação que, por muitas vezes, não explica de fato nada e dificulta a possibilidade de estudar os fenômenos do comportamento de modo mais acurado. Sendo assim, nosso bom humor não é porque é da natureza cearense sermos assim.


E para dar exemplo de que não há natureza cearense bem humorada, basta lembrar o Seu Lunga, segue uma reportagem sobre este cabra bem mansinho: clique aqui.

Bom, poderíamos, então, afirmar que o motivo de fazermos tantas piadas esteja ligado ao fato de termos vários modelos a serem seguidos. Afinal, como já foi citado, temos vários modelos de bons humoristas no Ceará. No entanto, ter modelos comportamentais não é suficiente para que ocorra modelação do repertório de quem assiste a um show de humor. Caso a comunidade verbal não reforce o comportamento imitado, este deixará de ocorrer. Assim, ter modelos comportamentais de bom humor não são o suficiente para manter a prática.


Ter modelos comportamentais é condição para que haja transmissão de topografias de uma resposta (ou mesmo está ligada a outros processos comportamentais). A manutenção da imitação dependerá das contingências de reforço e, assim, manutenção da função do bom humor, independente da topografia inicial imitada.

PONTUANDO: vejamos só, se dependesse mesmo só de seguir modelos, não teríamos inúmeros modelos de piadas ruins nos dias de hoje. Chico Anísio, por exemplo, teve diversas personagens e, no entanto, não vemos pessoas seguindo seus modelos (apesar de compreender que há a questão de que é interessante a criação de personagens novas e não simplesmente imitar a de alguém).


Continuando, daremos agora algumas hipóteses de como a prática cultural bem-humorada dos cearenses foi selecionada e mantida. Mas, quero deixar claro que a primeira pessoa que eu vi falando sobre estas hipóteses foi um colega de graduação (atual colega de mestrado), então estas hipóteses não são produção minha!

Como sabemos, o estado do Ceará é uma região de clima quente e sua vegetação predominante é a caatinga. Normalmente, nossas paisagens são retratadas como sem graça para quem está acostumado com imagens muito arborizadas, como da Europa. Inclusive, durante a terna infância, nossos livros de histórias infantis retratam paisagens referentes a Europa e não a nossa diversidade ambiental.


Agora, imaginem as diversas secas que houveram em nosso estado. Imaginem que houve escassez de alimentos e água, bem como meios de nos divertirmos. Dentro destas condições de seca, podemos dizer que era uma condição de privação de diversos estímulos que poderiam funcionar como reforçadores. Imaginemos agora que, em uma reunião casual, alguém emita uma piada envolvendo a situação difícil e faça rir. Digamos que, apesar de não matar a fome ou a sede, alivio a condição aversiva que estavam expostos.

Segundo Skinner, rir é uma resposta relaxante. Assim, poderíamos supor que este foi um comportamento selecionado por amortecer as condições aversivas e foi estratégia de sobrevivência diante da adversidade ambientais. Outro ponto, pessoas bem humoradas são socialmente reforçadas a se comportarem assim, são modelos de comportamento valorizados em nossa cultura. Inclusive, às vezes complica a vida dos cearenses, pois muitas pessoas de outros estados pressupõe que sempre faremos piada e se espantam quando alguns de nós não sabemos fazer.


Resumindo: Dentro de nossa hipótese, o ambiente aversivo (seca e privação de alimento e água) promoveu a variação do comportamento verbal dos cearenses cujo comportamento de fazer rir foi selecionado por dar reconhecimento social ao emissor e causar relaxamento à audiência. Por exemplo, uma criança imita um adulto que faz piada e as pessoas riem. no decorrer dos anos, ela vai variando as piadas e os contextos sociais das piadas, ou seja, vai aumentando a variedade topográfica da classe de resposta "fazer rir". Ganha dinheiro e reconhecimento social por isso e se mantêm praticando o "fazer rir". Outra criança o assiste e segue os mesmos passos a sua própria maneira.

Assim, podemos supor que desde a época da seca nossa comunidade verbal valorizou pessoas que emitam comportamentos de fazer rir e esta prática se manteve independente do contexto em que se iniciou (privação), dado seu valor social.

Pronto, temos uma explicação convincente do porquê nós cearenses somos tão gaiatos?

"Fecha a conta e passa a régua!"
Agora, se alguém se interessou a compreender o Comportamento Verbal Humor, indico o seguinte artigo de Maria Marta Costa Hubner, Caio F. Miguel e Jack Michael: Controle Múltiplo no Comportamento Verbal: humor brasileiro e operantes relacionados.

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